domingo, 4 de dezembro de 2011

O MORCEGO DE MAYOMBE

(X conto)


Na floresta de Mayombe, Tati era um morcego feliz. Vivia com sua família e tinha tudo. Frutas abundantes, insectos com muitos nutrientes e uma família que cooperava na segurança e conforto. O ninho em que viviam era de plumas recolhidas junto a um aviário. Tati vivia em festa permanente, pois nunca lhe faltava nada.

O andar do tempo e a destruição do seu habitat trouxe, entretanto, alterações na sua vida.

Primeiro apareceram os madeireiros e derrubaram a árvore em que estava o seu ninho. Foi um dia muito triste, pois chovia muito em Mayombe e a família de Tati teve que dormir ao relento.

Quando a chuva terminou, ainda tentaram construir um outro abrigo, mas as plumas que aqueciam os abrigos ninhos tempo de chuvas ácidas estavam cada vez mais difíceis.

Depois surgiram as pestes, devido à poluição que se fazia sentir na região. As fábricas mandavam muito fumo para a atmosfera, as britadeiras faziam muita poeira e os esgotos das residências estavam todos apontados para os rios. Todos começaram a sofrer: os homens, os animais e até as plantas. Ninguém tinha um ar puro nem água potável.

Tati, o morcego de Mayombe que já era órfão de pai, perdeu a mãe e, depois, os seus cinco irmãos.

O sofrimento instalou-se e Tati começou a passar fome e falta de companhia.

Primeiro, juntou-se a um grupo de ratos que procuravam por comida debaixo duma árvore. Tati apresentou-se e contou toda a sua história: da perda da família, da destruição do ecossistema que grassava pelo Mayombe e da solidão da sua vida. Um dos ratos, Madyeco, que era por sinal o mais pequeno e muito instruído, ainda chegou a dar um abraço a Tati, mas os mais velhos, vendados pela ignorância, retiraram-se e negaram toda a aproximação com Tati.

- Oh Madyeco, estás burro ou quê? Já alguma vez viste um rato com asas? Isso é obra de Satanás. Anda dali, pá! - Ordenou o mais velho do grupo de nome Ntengo.

Madyeco teve de seguir o grupo e Tati continuou sozinho.

Veio a noite e depois a manhã. Um bando de passarinhos festejava na copa da árvore a chegada do rei sol. Tati acordou e depois da higiene matinal decidiu juntar-se a eles. Os morcegos geralmente são noctívagos e não se apresentam durante o dia, mas Tati fez coragem e lá foi ter com os passarinhos. Mal se apresentou, já dois deles zombavam da sua presença.

- Hi-hi-hi… - ria perdidamente Kadyembe, um passarinho conhecido na floresta pela sua loucura. - Vocês já viram, alguma vez, um parente nosso com pelos? - Perguntou outro, retirando-se posteriormente em voo rasante sobre as árvores mais baixas.

- Tati sentiu-se tão mal com o comportamento daqueles jovens ignorantes que nada entendiam de convivência pacífica entre as espécies. Abordou o passarinho que parecia ser o mais velho do grupo para explicar que apenas queria conversar, já que estava sem os seus parentes, mas Ntyete, o chefe daquele bando, também o desprezou.

- Sai daqui seu dentuço. Não há, por esta floresta, pássaro nenhum que tenha dentes. - Alertou ao seu grupo que se retirou de imediato.

Com a segunda desfeita, Tati não teve outra saída que não fosse o seu recolhimento ao ninho.

Com o desgosto da desfeita, Tati deixou de comer em condições e a vida para ele parecia não ter mais sentido.

Um belo dia, quando tudo parecia perdido, apareceram perto da árvore que suportava o seu pequeno ninho uns homens com roupas que se pareciam a folhas de árvores. Os homens de verde inventariavam os estragos que a desflorestação tinha causado à flora e à fauna do Mayombe. Notaram que muitas árvores tinham sido cortadas e os animais, sobretudo os morcegos que à noite embelezavam a floresta com seus voos, tinham desaparecido.

- Vamos preservar a nossa herança colectiva. - Disse um deles.

- Sim. Vamos recolher tudo o que for exemplar único para que possa viver e reproduzir-se. Temos de fazer com que os nossos filhos vejam árvores, pássaros e outros animais como nós víamos quando éramos pequenos. – Responderam os demais integrantes do grupo que carregavam uma enorme gaiola onde colocavam todos os passarinhos que encontravam solitários .

Tati apercebeu-se então que podia ser salvo da morte anunciada. Fez a última força que lhe permitia o seu corpo e saiu do ninho.

Os homens recolhiam também para um zoológico os animais e as plantas que estavam em vias de extinção para os preservar.

Os ambientalistas levaram-no ao jardim zoológico de Simulambuco onde Tati vive até hoje muito feliz, com outros animais e aves de várias espécies recolhidos do Mayombe.