sexta-feira, 1 de março de 2024

TRAVESSURAS ESGOTADAS

 

Editado e publicado no Brasil pela TM Editora (apenas 30 exemplares chegaram ao autor), aparece na bloguesfera como "esgotado" tendo sido comercializado a cerca de USD 10.
Apesar de termos firmado contrato, não nos chegou nenhuma pecúnia. Alegra-nos, entretanto, saber que o livro foi/está a ser lido na outra margem do Atlântico.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

VIAGEM LITERÁRIA AO "MANONGO-NONGO" DE SOBERANO KANYANGA

Caracterizar um escritor com estilo multi-literário, caso nos seja permitido o uso do termo, não é uma tarefa fácil. Quando ainda nos deparamos com a universalidade das suas obras que nos guiam ao além da ciência e transmitem ensinamentos fecundos e visíveis.

Assim tomamos algumas palavras para manifestarmos o valioso contributo literário da obra supracitada. No estilo infanto-juvenil,  procura nas suas linhas pedagógicas, educar a sociedade hodierna, mormente a classe juvenil, à base de estórias criadas e recriadas pelo autor e concebem no final de cada uma delas, um ensinamento moral.
Como podemos conferir e sentir a luzidia mensagem em "A CEGA E O CÃO KELULA", pp.45-47 «entre os amigos ou pessoas que se amam deve haver confiança mútua». Quão pedagógico e profundo, é este discurso que não se escapuli do messiânico!
É ainda transcendental a imaginação do autor, quanto a criação e recriação de estórias que encerram com princípios morais que à luz da visão hodierna, reflectem uma filosofia de valores, concebida para uma sociedade onde se presencia o adeus dos valores morais e cívicos.
E o autor, sendo filho deste país chamado Angola, ensina em "A COMILONA E O CISOMBE", pp.67-70, que: «A gula e a avareza são vícios perigosos que podem levar à morte. Não deixe de dar de comer a quem tem fome».
E por que o autor teria escolhido o tão sugestivo título para o seu livro?
Antes de deixarmos o autor responder a tal questão, gostaríamos de viajar até Belém da Judeia, para lembrarmos o nascimento de Cristo Jesus e a visita dos Reis Magos que culminou com a entrega de presente valiosos da época. Assim também acontece no território nacional, singularmente nas Lundas onde o autor viveu durante muito tempo. É costume, a familiar criar um ambiente festivo junto dos amigos, para saudarem a anunciação do novo membro da comunidade.  Neste ambiente, saboreiam-se os kitutes da terra e nota-se a bonança da variedade de bebidas.
E não está de fora o nosso autor quando nos brinda do seu íntimo, este seu "MANONGO-NONGO", do qual nutrimos em letras de ouro e em páginas cintilantes os fecundos ensinamentos. Como pode responder no preâmbulo que faz da sua fantástica obra: «Escolhi o nome  Manongo-Nongo para este livro por desejar que venha a ser também uma festa para todas as crianças de Angola que devem crescer com sabedoria e inteligência encontrada e transmitida nos livros que lêem e nas experiências transmitidas pelos mais velhos».
Quanta solidariedade e respeito pelo próximo o autor manifesta! Se o Manongo-Nongo é uma festa, então que festejemos também nós e deixemos a alma rejubilar de glória por tê-la.

Beto Baião
Kwango LN, 20/07/2014. 22h00

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

IDEIAS REVOLUCIONÁRIAS DE MANGODINHO

A noite tinha sido chuvosa. Chuva grande com vento e trovoadas. Parecia que as montanhas mais próximas se iam encontrar e ensardinhar todas aquelas aldeias que se achavam no perímetro de Tumba Grande.

Mangodinho e o Soba Toneco haviam combinado comunicar ao povo as ideias do administrador comunal, camarada Maria, e as deles.
Era seis da manhã e um quarto quando fizeram tocar o sino do costume.
- Ndrim, ndrim, ndrin. Três vezes mais outras três, mais outra sequência tripla.
Os mais velhos foram se aproximando ao local das reuniões, que tinha passado da mulembeira ao pátio da escola onde se projectava um njango comunitário, última ideia de Mangodinho. 

Na verdade, ideias é o que não faltava. As pessoas com poder de as assimilar e materializar mais os recursos para fazer acontecer é que eram escassos.

O miúdo Russo, uma espécie de responsável pela comunicação, estava a ser projectado e cuidada de convocar, boca-a-boca aqueles mais alérgicos àsreuniões da aldeia, normalmente os que mais resmungam e pouco cooperam.

- É assim mesmo. Cada faz bem o que sabe e aprende o que gosta. No tempo certo, recebe o cargo. - São palavras de Toneco que fez esse percurso desde miúdo na aldeia de Kuteka. Mangodinho também está a subir e miúdo Russo está a vir atrás dele.
Mangodinho foi dos primeiros a chegar para receber as pessoas. Depois é que chega o Soba Toneco. O último e que dá início à reunião.
O secretário Mangodinho fez a introdução sobre a chuva, os estragos "que vamos ver na aldeia toda e nas lavras" e o que é preciso fazer para que o mal seja maior.
- Bom dia, meu povo, minha família! A noite não foi de tranquilidade. Já vemos chapas voadas. Capim arrancado por cima das casas e, nas lavras, vamos ver quando sairmos daqui. - Disse Toneco, à guisa de arranque. - Porém, tenho ideias que transmitiu o administrador e quero bos fazer chegar.
Toneco fez pausa para ver se o povo estava ou não a gostar. Passeou os olhos pela multidão e sentiu que podia avançar.
- Pois, então, a ordem é para construirmos latrinas ou sítios para fazer as necessidades maiores. Da maneira que é: pessoa vai na mata com porco a te seguir e depois vem o porco a mexer na comida acham que está bom?
- Não! - Responderam.
- Ainda bem. O Mangodinho, depois, vai explicar ponto por ponto.
Fez outra pausa e, desta vez, afinou também os ouvidos para conferir se havia murmúrios. Às vezes o povo grita que sim, mas rejeita com murmúrios.
- O segundo ponto é sobre o Posto de Saúde que é importante construir. Alguém quer falar? - Hábil, Toneco deu palavra para espremer qualquer contestação e fazer o remate final.
- Ngana Soba, infirmero não tem ainda, vamos já construir? Ou tem outra ideia boa? - Questionou Kajobiri, uma velha de pouca fala.
- Sim mamã. Nesse caso também, o secretário vai esclarecer, mas vamos usar o mecanismo que fizemos para ter escola: construímos já o Posto e casa do enfermeiro. Depois, pedimos o mestre. Também, a aldeia vai escolher duas pessoas, jovem de homem e de mulher para ir no Sá da Bandeira fazer curso de enfermagem. Os interessados contactem já o nosso secretário.
Toneco parou para mandar ar aos pulmões. O povo aproveitou agradecer as palavras com três rajadas fortes de palmas.
- Mas não terminei ainda. Posso continuar?
- Pode. Estamos a gostar, Soba.
- Falta o poço. Posso?
- Pode. - Responderam.
- Poço, é buraco para tirar água. Vamos cavar, aqui mesmo na aldeia, até encontrar água. Vamos construir as paredes com adobe queimado e veremos uma manivela com tubo para fazer tipo chafariz. Assim, a água do rio será só para lavar e tomar banho. Para beber e cozinhar será já aqui. Beber no mesmo lugar com os animais é que está a trazer muitas doenças. Fica ou não fica bom?
- Fica, fica, fica!
Em quarto, lugar, o administrador mandou outros sobas e secretários a virem aqui ver o que estamos a fazer para melhorar a aldeia. Quando vos contactarem, ensinem os outros, mas perguntem também as ideias deles para fazermos o que eles têm de avanço. Pode ser?
- Pode!
- Então, os homens todos ficam com o Mangodinho e as mulheres podem avançar no mata-bicho e na produção.
- Puá, puá, puá. - Choveram salvas de palmas.
O Soba e o secretário ficaram com os homens, jovens e adultos, a acertar os pormenores de cada acção e as responsabilidades e incumbências de cada um.
A construção das latrinas familiares e colectivas, o Posto Médico e a casa para o enfermeiro, o envio de dois estudantes ao Lubango e a construção do poço ficaram confirmados como os desafios da aldeia de Pedra Escrita que se quer inscrever na lista de "Comunidades inovadoras" do Lubolu.

Publicado pelo Jornal Cultura de 7.12.2022