Um gajo na terra dos outros,
mesmo que saiba falar a língua deles, sofre. Sofre por desconhecer os nomes dos
“jangutos”, por desconfiança que se apercebam que és estrangeiro e te armarem
uma arapuca, sofre porque viver uma “vida mulata” de curta duração, sofre com o
frio ou calor se calha em viajar num período de clima inverso ao deixado na
banda, sofre até com a falta de buracos, lixo nas estradas e canos de água
rebentados a jorrarem a toa por tudo quanto é canto. Há países em que você vive
bem mas sofre com a saudade das coisas boas e más da “matherland”. Passou-se comigo nessa curta escala pela terra do
vovô Mandela.
Nas proximidades de Sundton Conference Center as ruas estavam
apinhadas de polícias com carros blindados. Sozinho, naquela rua com magnatas
que chegavam minuto a minuto e alguns acompanhados de batedores, senti-me
perdido para ir ao Nelson Mandela Square e conseguir os Rands para reforçar os
"cheiros à maneira" e procurar um pitéu de verdade.
Verdade se diga, cheguei à
conclusão de que o angolano cheira bem e não é a toa que quase todas as “mboas”
do Shoping me estavam a colar que nem mosca numa porcaria kimbombada.
-
Hello, how are you. I have same thing nice for you. - A
mboa, bué ancuda, fez um sorriso interesseiro e começou já, ali mesmo, a me
"aproximar" para ver se me kasumbulasse uns dodós, só que ela se
enganou mbora com a cara da pessoa. Os dodós que ela queria me tramankaram ‘mbora
com eles há três semanas...
- I can´t speak english. - Defendi-me, procurando afastá-la.
A mboa até não era tutu, tutu,
quando comparadas com umas aí que conheço, mesmo na “Ngimbi”. Mas ela queria é
o meu “kumbú” ou confirmar se eu era estrangeiro “bunfunfado” para mandar me
tramakar, sei lá mais quê.
- I can help you with my Google translater sound. - Voltou a atacar,
tentando encontrar alguma fraqueza do meu lado. Mas eu, um gajo viju, com
trinta anos a viver na Ngimbi não fui na conversa e comecei a fazer ouvidos
desinteressados.
- I have no money. - Voltei a defender-me e sondando já por onde
sair voado. A kindoza tentou ainda
contra-atacar-me com o "but you
smell well and dress like a government in a conference". Se era
verdade ou mentira é já com ela. O que fiz foi dar uma de às e zarpar dali. Era
hora de ponta e o Shop começava a apinhar-se de gente. Já tinha dado umas
tantas voltas e não tinha encontrado a casa de câmbio. Também não dava para
bandeirar. Os mwadyes podiam ainda pensar que um gajo é “mbalu”. Desculpei-me
com o "Sorry, I have to go, mum",
ao que acedeu, embora relutante e procurando mais prosa. Bazei.
Mal cheguei à esteira rolante,
um outro tipo, que me recordou os “enganadores” do finado Roque Santeiro,
abordou-me empunhando uma pasta e um pequeno embrulho que tinha uns mambos tipo
anel ou outras joias: "Please
brother. I have something very nice foy You". - Disse ele, abrindo a
sacola e retirando um pequeno embrulho avermelhado em que se supunha estar o
tal "something very nice fou
you". - Respondi-lhe com um soletrado "I can not understand you because I no speak english". O “manga”
ainda tentou insistir, acompanhando-me até ao fim da escada, mas eu apanhei a outra
e continuei a trepar o edifício, somente de abuso. O indivíduo regressaria ao
piso inferior para domar outra possível vítima, normalmente estrangeira e
desavisada.
- Vai rezar caçar noutra
coutada mazé, pá! – Disse para mim mesmo.
Era já a minha quinta volta e
no sobe e desce, ora caminhando sobre escadas outra indo na boleia do tapete
que, afinal de contas, faz muita falta a quem esteja cansado, a procura do “changing post”. Abro um aparte para
questionar por que as nossas poucas instituições com aquele meio de transporte
entenderam aposenta-lo antes mesmo da maturidade.
Na tentativa derradeira,
encontrei o "changing post" e lá consegui uns poucos “Mandelas” que
me levariam a caçar a funjada ou um parente próximo do pitéu que me fez
crescermos. E não é que encontrei mesmo uma funjada de carne assada? Até os
pólices de JOBURG abandonaram os postos (ou aproveitaram a renda) e foram se
lambuzar com as mãos no sítio em que os rastas e outros artesões realizavam a
feira de artesanato para os "foreigners se desdolarizarem” e levarem
estórias do país do arco-íris para a casa. Só não consegui é fotografar os
magalas a pitarem, sem vergonha e nem receio (como acontece por cá, entre as
nossas gentes que se faz passar por europeus quando nunca sequer passaram o
estreito de Gibraltar), a sua "papa
and beef". E o canal entre o prato e a boca eram mesmo os dedos, sem
kijila!
- How much this food? - Indaguei estrategicamente na ignorância do
nome real do “janguto”. Porém, como azar não custa, a senhora que me atendeu na
roulotte colocada sobre o passeio,
lançou-me um "wich one"? Só
que o “mwangolê” é vivo e, sendo libolense, um pouco mais ainda.
Encostei-me à roulotte, quase sentindo a sua quentura
e engolindo aqueles cheiros que faziam um cão faminto fazer das narinas uma
nascente. Fiquei entre um polícia e um kota negro, fininho, que tinha os
cabelos penteados para trás e que falava uma língua distinta do inglês. Eles
têm perto de dez línguas oficiais, entre as de origem africana e europeias. Reparei
rapidamente nos dois pratos que a “mboa” acabara de servir e apontei ao que
tinha uma pasta branca feita a base de farinha de milho.
- This one. Estiquei a mão para
que mais dúvida não houvesse. E para que a sul-africana não desse conta do meu
sotaque e da minha pobreza lexical, lancei de imediato um "how much"?
Levei o marmitex ao hotel, que ficava a vinte metros, onde, também com as
mãos, para não ofender Shaka Zulu e seus ancestrais, devorei o conteúdo com o polegar,
indicador e o dedo médio da mão direita. E soube a Libolo, nos tempos da minha
infância. Só faltou Xxila!
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