Suraya, esbelta de
parar o transito, gabava-se de ser a mais elogiada e que tudo fazia para
impressionar os colegas e a chefia todos os dias. Atendendo que os chefes
tinham decidido ser madrugadores, ela, catadora de elogios, começou também a
chegar cedo ao serviço, gingando de um lado para sitio incerto. Porém, mal
começassem a chegar os colegas sem olhos para a sua montra, ela se retirava
para o andar em que se situava o secretariado onde se ocupava mais em buscar
actualidade do mundo da moda, através das redes sociais, do que do seu trabalho
que até estava clarificado no descritivo de funções. E gabava-se de sol a sol
que era pontual.
- Nessa organização
não há quem chegue mais cedo do que eu, por isso mereço promoção e uma gala
para me homenagearem. - Atirou, certa vez numa actividade social da
organização.
- Você, Suraya?
Nunca. Nem pensar. Nem que a vaca fale. Chegas cedo mas não és assidua. És uma
pisca-pisca (dia sim, dia não vens) e quando se olham para os teus resultados
parece que só são borboletas que caiem no teu cesto. - Zombou Tina, outra
colega que tinha a má fama de trabalhar apenas quando a lua estivesse no centro
da circunferência celeste.
A discussão,
aparentemente sem nexo, ganharia força quando chegou Rita. Rita era uma senhora
"Baby boom" que fora já reformada e recontratada devido ao seu apego
ao trabalho e seu perfeccionismo naquilo que fazia. Não precisou de fazer parte
daquela histérica algazarra, pois era exemplo de dedicação, bom desempenho e
comprometimento. Vestia a camisola, via-se. Entretanto, não era tão pontual, nem
muito assídua devido aos compromissos familiares. Era do conhecimento da
chefia que dela cobrava resultados e não presença física obrigatória. Dona
Rita, ou mesmo vovô para os mais brincalhões, tinha entretanto uma agenda de
encontros presenciais bem arrumada e não se atrasava às suas reuniões. Das suas
poupanças tinha conseguido instalar telefone fixo e internet em casa, um
computador, impressora e um scanner que lhe permitiam trabalhar "at
home" e apresentar resultados surpreendentes.
Quando a senhora se
fez presente naquela sala em que se comemorava o aniversario da organização,
dois grupos miravam para ela toda a atenção: uns, sobretudo aqueles que
enxergavam qualidades e que com ela procuravam aprender, seguindo os seus bons
exemplos, a aplaudiam e apontavam como a mais provável homenageada da noite. Era
já habito do titular de direcção daquela organização homenagear o trabalhador
mais produtivo do ano. Outro grupo, composto maioritariamente pelas gerações Y
e Z cochichavam que a "velha" já estava fora de tempo e que naquele
ano não levaria sequer um elogio do chefe. Apostavam mesmo que a "senhora
dos mil prémios" como também era conhecida sairia dai banhada de lágrimas
porque o tempo dela já tinha passado.
- Essa tia que chega
quando quer, até o chefe já sabe que ela é uma cansada e chata, o que que veio
fazer? Acha que leva daqui alguma coisa? Atirou Gina, uma jovem que ainda nem
era do quadro permanente de funcionários.
Quando o titular
chegou, mal se dirigiu ao presidiu para cortar o bolo, chamou dois nomes: Dona
Rosa, a mais idosa da organização, e Dra. Suraya, uma das mais novas e mais
extravagantes, para junto dele.
A Suraya já tinha
distribuído beijinhos e abraços a todos os colegas, contando que seria a
estrela iluminante da noite.
- Chamei as duas
funcionárias que refletem dois exemplos de na nossa organização. - Disse o
titular, prosseguindo. - A dona Rita é quase invisível. Chega numa altura em
que todos já estão nos seus gabinetes e muitas vezes sai quando todos estão já
nos seus aposentos. Até seus encontros com clientes e fornecedores acontecem sempre
depois das 8h30. Faz tudo ao detalhe e não deixa nada para o dia seguinte. A
Dra. Suraya, continuou, é das que mais cedo chega, das mais vista pelos
gabinetes e corredores. Porém, a medição que temos vindo a fazer é por
resultados. A Dra. Suraya produziu durante o ano findo que hoje comemoramos, dois
terços do que ganha e a Dona Rosa foi, directa e indirectamente, responsável,
por um terço do resultado da nossa organização. Peço uma salva de palmas à
nossa estrela da noite que ganha uma bolsa familiar para licenciatura. –
Concluiu o boss.
Pasmos, os mais
jovens não perceberam por que razão a sexagenária iria estudar quando eles que
se gabavam ter "toda a vida e todo o sangue para derramarem em prol da
organização" ficariam em terra. Jaja, outra das colegas, e Suraya chegaram
mesmo a questionar os critérios usados pela administração para encontrar o
vencedor do prémio de e por que razão iria Vovô Rita à formação, estando já sem
força. Suraya alcandorou-se do facto de ser regular e por isso merecedora da
distinção. Outra, a Jaja, apregoou a sua pontualidade. Mas o presidente, astuto,
contou-lhes a estória sobre os três relógios: um é de prata, toca o despertador
à hora certa mas não tem o ponteiro dos minutos. Outro é banhado em ouro e não
funciona. O terceiro é de plástico metalizado e tem os ponteiros completos,
marcando correctamente as horas e o despertador.
- Qual dos três me
faz falta? Questionou o titular.
A geração Z optou
pelo de ouro, alegando ser um adereço moderno e vistoso. A geração Y optou pelo
de prata pois, dizia, embora mais modesto do que o primeiro, tinha algo
funcional, o despertador, que permitia o titular não se atrasar nos seus
encontros. As gerações M e X optaram pelo relógio de plástico banhado em metal
por ser o que funcionava em pleno.
- Pois é, todos
parecem ter razão, mas o relógio que me apresenta resultados é aquele que
funciona. Assim também são os funcionários, prosseguiu. Não basta chegar cedo,
quando se vem, ou vir todos os dias em horários distintos. Pontualidade e
assiduidade devem ser regulares, estando acima de tudo a produção. As
organizações são talhadas para os resultados e não apenas para as presenças
físicas dos funcionários. -Deixou explícito o titular.
Todos compreenderam a
mensagem e ouviu-se uma estrondosa salva de palmas em homenagem à sexagenária
Rita.
Texto Publicado pelo Semanário Angolense a 21 de Julho de 2015
Texto Publicado pelo Semanário Angolense a 21 de Julho de 2015
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