- É mentira! É
verdade! – A disputa punha jovens na flor da idade em dois campos opostos. Cada
grupito puxando a sardinha à sua brasa.
A conversa sobre
meninas e minas já levava hora e a aula de economia não ganhava pernas para começar.
Professores e alunos passavam em revista os últimos acontecimentos e as últimas
noticias divulgadas pela media.
Inspirando-se em
Arlindo Barbeitos, Kexijina Lamba, que já estava farto da certas conversas
sobre minas, pediu ao professor e aos colegas para ler um texto que tinha
escrito na última noite, depois de ouvir mais uma estória cabeluda sobre minas
que disputam a maternidade angolana em termos de números.
E começou:
“Há muitos anos houve em tempo em que
o pais foi minado pelos militares de diferentes exércitos que aqui se
pleitearam por várias razões e convicções. Minaram os tugas que tudo fizeram
para não serem corridos do país que lhes era alheio, minaram os movimentos de
libertação nacional que pretendiam acabar com cinco séculos de domínio
estrangeiro, minaram os rebeldes do pós-independência, minaram as forças do
Governo da República Popular e minaram os exércitos “socorristas” de África,
América e Euroásia.
Há muitos anos
houve um tempo em que se dizia que havia uma mina para cada um dos angolanos e
que restavam umas tantas outras para estropiar quem cá encontrasse poiso…
E o sermão das minas levado de rádio em rádio, de jornal a jornal e de
televisão em televisão passou de boca em boca como o passa a palavra das forças
armadas em combate contra a verdade das minas.
Mina por cá, mina
acolá até que o povo deixou de fazer agricultura com medo delas. As cinturas
verdes que noutros países em situações análogas de conflito eram normais e
crescentes tinham desaparecido pois aqui só faltam existir minas voadoras
como os aviões de comida importada pelos próprios propagandistas das minas. E
os miúdos que nasciam desconheciam a jingubeira e o milheiro, pensando que a
jinguba fosse uma invenção fabril ou das lojas dos “governantes mineiros” e o
milho procedente duma planta chamada PAM.
Há muitos anos
houve um tempo em que, preocupados com as notícias sobre as minas, vieram de
todos os cantos ONG´s calejadas em localização e desactivação de engenhos.
Desminaram falácias sobre minas à volta das cidades que impediam a horticultura
, a avicultura e a pequena pecuária refugiada no medo crescente dos engenhos.
De repente as cidades começaram a produzir. Couve-flor, aguardente e frutas
também. Tubérculos, ovos e leite também. E os homens dos discursos mineiros
cedo se tornaram em novos evangelizadores do verde periurbano, tornando-se
donos . Roncaram moto-bombas, desviou-se água da boca para a raiz da hortaliça.
Mas as minas continuaram milhares e impossíveis de erradicar no interland,
agora com novos donos e vítimas de sempre e como os discursos de sempre.
Há muitos anos
houve um tempo em que se apregoou que as minas, mesmo aquelas implantadas em
zonas onde nunca houve presença militar precisavam de ser desactivadas,
explodidas ou apenas transformadas em outras minas cabíveis em bolsos gordos de
verdura americana. E se condicionavam agricultura extensiva, estradas
distantes, cidades largas, tudo se condicionava às minas por estancar dando
lugar a outras minas.
Há muitos anos
que se vai desminando, sempre que se plante uma mandioqueira, um poste de
energia periurbana, um prédio urbano, uma cantina agrícola. As minas
tornaram-se também minas no decénio da probidade que enfeita discursos repletos
de minas que dão transbordo a bolsos de dezenas que se riem ad eternum, a
desfavor de milhares de mutilados por falácias e repletos de fome e nudez
causado por minas.
Há muitos anos
houve um tempo em que os engenhos implantados pariram minas!”
Kexijina Lamba
terminou, com aplausos, a composição que tinha sido o tema para trabalho caseiro
que consistia em reflectir sobre o impacto das minas pessoais na economia do
país.
Kexijina Lamba
terminou, com aplausos, a composição que tinha sido o tema do trabalho caseiro
que consistia em reflectir sobre o impacto das minas pessoais na economia do
país.