terça-feira, 21 de julho de 2015

OS MONSTROS QUE AS QUEIMADAS COLOCAM A NÚ


O suprimento da saudade que os sufocava, havia já mês e meio, fê-los sorver aquele momento único em surdina. Era como sugar o tutano na mais profunda intimidade. Ele instalado nela (carrinha) e ela dando gozo ao longo de léguas que separavam o nordeste do centro-oeste para aonde se dirigiam.

- Lembras-te, Soba, quando viemos parecia não haver ferro retorcido ao longo da via. Vês que a paisagem hoje mudou? - Disse ela em ruídos apaixonados.

- Sim, Maria. Temos ainda muitas sobras das guerras. - Respondeu o companheiro, enquanto a afagava com mais uma mudança de força.

Mas, Soba, donde vieram então esses monstros todos, já sem cor nem forma, e que fazem recordar os tempos do tri-tri-tri-buummmm?!

- Estavam escondidos, Maria. Eu também pensava que os catadores de ferro já tivessem recolhido todas essas lembranças das guerras e levadas à siderurgia nacional. Pensava que já estivéssemos a usar arados fabricados com despojos e destroços das guerras. Ainda bem que as queimadas à beira da estrada estão a colocar tudo à mostra dos recolectores de ferro velho. É tempo de obra para os ferreiros. - Explicou o amo.

A travessia de um grupo de adolescentes com pás nos ombros fê-los interromper a prosa oral para reflectirem sobre as pás que sulcam terra em busca de incertezas escondidas no subsolo, numa altura em que a paz permite ter escolas à dimensão dos aglomerados, porém algumas chorando por alunos refractários.

- Esses assim vão à tonga ou à campanha sabatina de limpeza escolar? - Atirou Maria inocente.

- Acorda, filha. Estamos em Xamikelenge. Aqui e na Muxinda as pás, mesmo em tempo de paz, significam ainda a busca de kamanga. As escolas têm ainda as carteiras vazias à espera desses mancebos. - Explicou irónico o dono dela.

- Soba, voltou a interromper Maria, quando falávamos sobre as sucatas acastanhadas de ferrugem e já sem as chaparias que ajudariam a descortinar de que tipo de veículo se tratavam, falavas em sobras das guerras, no plural. Houve por cá muitas guerras? Gostaria que me explicasses tim-tim por tim-tim. - Solicitou Maria quase suplicante e cortado já, a meio, a encosta de Kabatukila, Xinje, onde, por ironia, um camião carregado de ferro velho repousava ad eternum no meio da rodovia, entregando-se também à interminável quantidade de ferro por recuperar país adentro, recortar, transportar, fundir e transformar. - É preciso, afinal de contas, dar vida à agricultura e à construção de infraestruturas, o que passa pela reactivação da indústria siderúrgica, cogitou, sem no entanto o pronunciar.

- Sim Maria. Usei mesmo, e propositadamente, o plural.

Houve a guerra dos movimentos contra o colono, durante 14 anos, em que muita técnica das tropas ocupacionistas foi aniquilada nas emboscadas. Depois foi a guerra civil que também destruiu a técnica militar automóvel e rodo-transportada das partes conflituantes ao longo de 28 anos. Temos ainda a guerra infinita entre a estradas e os veículos, entre os automobilistas e as vias, que parece ser a mais dura e lúgubre. - Explicou seu amo.

Maria aprovou o discurso, solicitando uma mudança de menos força e mais corrida ao que Soba prontamente compreendeu e anuiu.

Prosseguiram a viagem entre silêncios, diálogos e afagos carregados de recordações e afectos. Maria, no auge da força e jovialidade. Ele, Soba, no auge do poder, vigor a paciência em contornar as inúmeras armadilhas e os incautos camionistas que, vezes sem conta, colocavam o traile no eixo da via, submetendo em risco a vida daqueles com quem se cruzam nesta batalha da busca do pão comum para o estômago vazio.

- Esses assim pensam que a estrada é propriedade privada deles ou que os outros não têm vida? - Desatou Maria, que não poupou um estrondoso muxoxu que lhe invadiu a boca. - Vão mazé, seus sacanas de merda, e tenham juízo nas vossas cabeças de gafanhoto, pá! - Concluiu resmungante Maria.

- É isso, Maria. Isso é pão de cada hora. É isso que alimenta os esqueletos metálicos na via. Alguns camionistas só se dão conta disso depois de entrar em prantos, envolvidos num sinistro, ou quando tripulando um veículo menor se depara com semelhante corneada. É essa a luta desigual que mais me preocupa. - Falou- lhe filosófico o amo antes de ser parado para uma fiscalização preventiva dos homens do apito laranja.

- Donde vem, senhor condutor? - Atirou o agente de farda verde e colete laranja.

- Do nordeste, senhor agente. – Respondeu o soba, já com a papelada da Maria e a sua em mãos.

Conferida a papelada, acto que se repetiu outras nove vezes ao longo do trajecto, o agente, caprichosamente aprumado com gravata e luvas, devolveu os documentos e fez o sinal de partida. Aliás, não faltaram as perguntas do costume: como vai a viagem e que notas de realce nos reporta, senhor automobilista­?

Não havendo acidentes ou incidentes graves ao longo de tudo quanto tinha percorrido, preferiu soltar um NADA CONSTA e seguir viagem até à cidade erguida sobre a encosta da montanha das cobras Ndala onde tomou a primeira refeição do dia que se acrescentaria ao meio litro de café que tomara ao longo das oito horas de estrada. Maria também reclamava pela segunda refeição, o que lhe foi servida sem hesitação. Havia ainda perto de duas centenas e meia de quilómetros pela frente. O sol despedia-se a caminho do grande Kalunga-Lwiji, ao ocidente. Sábado da batida e da Ngwenda na capital e arredores, na Catedral do amor católico, bem nas barbas do Kwanza que dá vida e dinheiro aos akwaxi, as devotas pediam dinheiro, maridos, felicidade e tristezas para as concorrentes. À espera de uns incautos desconhecedores das regras de trânsito ou das leis estariam outros akwaxi. É a lei da vida urbana e da selva. É a lei dos opostos. Maria que ouvira até aí os desabafos do seu amo voltou a questionar.

- Mas por que pedem algumas pessoas a morte de rivais, Soba­?

- É a lei dos opostos, filha. O que te faz bem pode não me fazer bem. O que pedes pode ser o oposto do meu desejo. Já vi duas rivais a rezarem para que a consorte desaparecesse do mapa. – Troçou o amo.

- Ai é­? Então leva-me à Muxima. Pretendo pedir que nessa estrada, da Capital aos Kwanzas, passes a andar somente com o António (nome de outra viatura), pois há muito que ando com a coluna sôfrega.

Entre curvas e lombas, sol poente, sombras e penumbra, seguiram seu caminho até à próxima paragem...

 

quarta-feira, 15 de julho de 2015

A CAÇADORA DE HISTÓRIAS PERDIDAS


Ela tem 35 anos e foi sempre seu sonho constatar in loco algumas das coisas que tinha aprendido nos livros do ensino primário do seu tempo.

Apesar de ter nascido depois de Agostinho Neto, Senje ainda estudou nos livros daquele tempo que se seguiu a revolução, onde os manuais escolares levavam o aluno ao pais inteiro.

Estudou a floresta de Maiombe e "o tronco da árvore", Cacuaco e "a vida na comuna", Lunda e "Cazaji e Mona Quimbundo", Quibala e "as sepulturas em pedras" como monumentos históricos, bem como Mandume ya Ndemufayo e o seu túmulo em Oiole. "Ekuikui II, escola número 80 do Huambo", entre outras histórias e estórias do planalto eram já "pão de cada dia" por ter nascido no planalto do Vye.

Convidada pelo marido e acompanhada pelos filhos, Senje foi surpreendida com uma pequena urbe do Leste de Angola que lhe tinha colado ao ouvido. Fora obrigada a decorar o texto do livro de leitura da terceira classe. Era obrigação, naquele tempo, quer soubesse ou não ler, recitar nas aulas os textos de leitura.

Nessa sua aventura de conhecer as emblemáticas localidades descritas nos livros de leitura escolar já tinha estado em Cacuaco, onde não mais encontrou as salinas e as fábricas, nem os peixes que "brilhavam como prata na areia". Os pescadores que encontrou eram uns biscateiros sem história nem paixão pelo mar. Acto continuo, seguiu no seu jeep à ainda comuna do Úcua, descrita como "a mais pequena, onde vivia a Ana, prima do Dudu, Beto e Tito que eram de Cacuaco". No Úcua, nem os personagens nem as vivências pôde reconhecer. Apenas animais quase vivos, a sagrar, pendurados em espetos e a aguardar por compradores. Desiludida, partiu para Quiculungo onde a "fazenda que o livro apresentava em fogo" era desconhecida de todos.

- Por que nos mentiram tanto? - Perguntara aos jovens que encontrara sem que deles obtivesse resposta. Mas não desistiu e Senje continuou a marcha, procurando dar sentido aos conceitos.

Chegou ao Leste e alimentou o sonho de conhecer "Cazaji e Mona Quimbundo" que ficavam a mais de meia centena de quilómetros de Saurimo. Seria o cumprimento dum velho desejo. Tudo o que aprender, através dos livros eram relatos sobre "um povo bravo na luta e que se dedicava ardentemente à agricultura do arroz, mandioca e outras culturas, à pesca, à caça e ao artesanato" que muita água lhe enche a boca, agora que vai conseguindo alguns kwanzas fruto do seu novo emprego. 

- Aonde vamos, marido?

- À fronteira.

- Com a Zâmbia ou Congo?- Insistiu Senje ao marido que se mostrava pouco dado a conversa. Na verdade queria manter o segredo quanto ao destino.

- Fronteira com o Congo Democrático que é o vizinho com quem mais terreno partilhamos. Vamos comprar "bubús". - Ironizou o marido, sempre atento à condução e pouco dado a falas.

Senje e os dois filhos, rapaz kasula e menina, se deleitavam com as paisagens naturais abundantes naquelas paragens.

- Papá, olha praia. - Atirou o kasula, ao que a irmã corrigiu:

- Não é praia. É rio.

- Também tem árvore, papá. - Voltou a alertar o rapaz encantado.

Senje ainda aproveitou apelar aos filhos para que não distraíssem o papá que estava atento à estrada e aos carros com que cruzavam.

Era tarde chuvosa e com visibilidade reduzida, para além de trafegarem na rodovia uns "kazukuteiros" em velocidade acima do convencional.

- Mas é mesmo para a fronteira que vamos? Quanto tempo levaremos? - Insistiu Senje.

- É sim e estamos quase a chegar. - Garantiu o marido depois de confirmar o contador de distâncias  do veículo  que registava já 51  dos 52 quilómetros que separam Saurimo do antigo posto militar colonial, também tida em alguma literatura histórica como  "a primeira capital da Lunda", antes de Henriques de Carvalho fundar a cidade associada hoje ao brilho dos diamantes.

Não tardou o grito de alegria.

- Eh, eh! Mona Quimbundo do livro da terceira! Obrigado pela surpresa. Era mesmo meu sonho conhecer essa localidade que já tirou muitas lágrimas a meus colegas da terceira.

Percorreram  a comuna, um antigo posto militar na expansão militar que se seguiu à Conferencia de Berlim, quando os portuguese precisavam de mostrar aos parceiros europeus que detinham o domínio sobre as terras de Mwatisenge, a leste da colónia de Ngola, e definirem com os belgas e ingleses as fronteiras das possessões saídas do encontro realizado na Alemanha entre 1884 a 1885.

Adentraram a comuna do "artesanato, pesca e agricultura" que não viram. Da agricultura ressaltavam apenas algumas estacas de mandioqueira que se perfilavam paralelas à estrada, uma produção que indiciava ser mais para auto-suficiência do uma produção direccionada ao mercado. As poucas cantinas estavam repletas de produtos importados e peça artesanal nem mesmo o largo da escola ou o da administração colonial tinha. Nas cantinas ninguém tinha visto ao longo do ano defunto.

- Artesanato ,aqui? - Era só mesmo no tempo de Agostinho Neto. - Atirou um idoso interpelado, acrescentando que "o único ganho que tivemos foi de sermos mais conhecidos do que a própria província e a sua capital. Todos os pioneiros da escola do país inteiro sabiam que existe uma circunscrição em Angola com o nome de "Mwa Cimbundu" e cujo povo pratica a agricultura, a pesca e o artesanato" - Explicou o septuagenário, sorridente.

Passaram pelo hospital comunal que possuíam uma ambulância. A escola tinha uma  placa a indicar "inaugurada por S.Exa. Primeiro-Ministro Nandó". Visitaram o Centro de Acolhimento de Menores e foram ver as antigas instalações da administração colonial: umas em ruínas que reclamam reconstrução ou substituição, para acabar com as "casas de kazumbis", e outras já refeitas do ostracismo a que haviam sido votadas durante os anos de "trungunguismo".

- Papá, quem vive nessa casa dos "cazumbis"? - Perguntou o kasule, atento a cada pormenor da viagem.


Nota: texto publicado no Semanário Angolense de 14.03.2015

quarta-feira, 1 de julho de 2015

QUARTA CLASSE DO TEMPO COLONIAL

- Papá, papá!
O rapaz, cinco anos, mochila vermelha às costas, calças enlameadas nos joelhos, irrompeu, sem licença, no aposento privado dos progenitores que procuravam a lua num dia combinado para ambos atrasarem aos locais de serviço e pagar o dízimo a quem de direito. A correria da capital faz, ultimamente com que algumas pessoas usem os aposentos apenas para descontar no sono.
- Há pessoas que nascem já com quarta classe? – Questionou Arcádio, aparentemente aborrecido e, a soltar vapor por todos os poros.
Nza Kutimbe ficou ainda a meditar, antes de fornecer uma resposta que não deixasse ainda mais confuso o filho “kasula”.
- Papá, e por que eu não nasci com quarta classe? Não quero mais estudar a pré-kabunga-come-pão-com-salada! – Sentenciou já com um dos pés fora do quarto.
- Arcádio, vem cá, filho. Vamos conversar. Tudo tem uma explicação. – Nza Kutimbe tinha já ideias, ainda retalhos mas davam para acalmar o puto que estava “fox” com aquela conversa dos contínuos da Escola Cinco que, no dizer deles, tinham “nascido já com a quarta classe” e, ainda por cima, do “tempo colonial”.
- Sim filho, há pessoas que dizem que nasceram com a quarta classe mas isso tem uma explicação.
- Quer dizer, papá, nasceram já a ler a fazer contas? E porquê que não me ensinaram já a fazer a-e-i-o-u e ba-be-bi-bo-bu na barriga da mamã? – Voltou a disparar o infante.
Carlota estava cansada. Também aborrecida, embora não o demonstrasse. Terça-feira era seu “dia da mãe”, o dia de dispensa mensal para levar os filhos à consulta médica e vacinação. Era também o dia em que Nza Kutimbe tinha de “fazer a manutenção” e partir mais tarde para o serviço. A “borla” dada pelo professor, devido à chuva daquela madrugada, tinha estragado tudo. O “kasula” chegou num momento inesperado e tudo tinha sido abortado. Consertava as extensões de cabelo e teria de partir, assim mesmo para a clínica.
Perante as intermináveis perguntas do filho “kasula” Nza Kutimbe teve de buscar por outra estratégia:
- Arcádio, ouve bem o que o papá te vai dizer. Antigamente, quando o papá ainda era criança, não havia muitas escolas públicas, essas do Estado. Também não havia muitos colégios privados, nem os africanos, os negros, tinham dinheiro suficiente para levar os filhos às escolas privadas. Então, as pessoas do bairro que já sabiam ler e escrever ensinavam os filhos daqueles que não tinham dinheiro suficiente para matricular os filhos nas escolas públicas. Quando chegassem à quarta classe iam à escola oficial apenas fazer o exame final. Como iam à escola só para fazer o exame final da quarta classe, é por isso que ficaram conhecidos como pessoas que nasceram com a quarta. Havia casas onde se davam essas aulas e eram chamadas por “Explicação”. Aqui ao lado no “Ngongo”, no bairro Kaputu havia a explicação do Senhor António, ainda nos anos noventa restavam esses exemplos. No antigo Comité Njinga, alí, naquela curva da rua que vai à tua escola, havia uma “explicação” muito concorrida e que já fez outros alunos da quarta classe do tempo actual.
- E se o papá e a mamã sabem ler e fazer e fazer contas por que não me ensinam aqui em casa para eu ir à escola apenas fazer o tal exame da quarta classe?
- Filho, hoje há escola para todos e algum dinheiro para você estudar na escola do povo ou no colégio. Em casa vamos apenas acrescentar aquilo em que os professores tenham dificuldade ou mostrar o método mais simples para conhecer as coisas.
- Papá eu não quero mais ir à escola. Quero também ter a quarta classe do tempo colonial!
A pergunta inocente do rapaz fez Carlota intervir pela primeira vez naquela conversa de pai e filho, frente-a-frente.
- Arcádio, já não temos colonos. Tempo colonial é o tempo dos teus avós quando os brancos é quem mandavam e os pretos só cumpriam sem refilar.
- E hoje quando vos mandam “nos” vossos chefes que são negros, a mamã refila? – Atirou Arcádio que já tinha ouvido a mãe a reclamar variadíssimas vezes da forma menos urbana e cordata dos seus superiores.
- Nza, termina a conversa com o Arcádio que já tem o lanche a esfriar… - Despachou-se do rapaz.
- Papá, explica-me então o tempo colonial e a quarta classe deles.
- Pois filho, no tempo em que Angola era colónia quem mandavam, o presidente, os ministros, os directores, eram todos portugueses que tinham saído de longe para nos dominarem ou mandarem na nossa terra. As pessoas que fizeram a quarta classe naquele tempo gabam-se de ter estudado bem. Sabiam mais coisas do que sabem hoje os nossos alunos. Há mesmo doutores que sabem menos, sobretudo fazer as contas e resolver os problemas matemáticos.
- Papá, a matemática é boa?
- Sim filho. É excelente.
- E porque não começa com “boa” temática? Como é que uma coisa que já começa com “má” pode ser boa? O papá nem precisa de me explicar essa parte. Eu já sei.
Sabes o quê, Arcádio? Sabes fazer contas? Os teus manos fazem contas?
- Sim papá. Eles usam o telefone e o computador.
- E a cabeça serve para quê, filho?
- Para se lembrar do computador e do telefone onde já têm tudo.
Nza Kutimbe sentiu que estava a perder batalhas perante o filho que já se tinha apossado do seu ipad. Mas preferiu rematar.
- Nenhuma máquina é mais inteligente que o ser humano, filho. Você pode se encontrar numa situação em que não tenha de fazer recurso a computador ou telefone. Há contas que temos de fazer de forma mental. Pensar e dar resposta. O papá quando conduz faz contas das distâncias para travar, para ultrapassar, do combustível que tem para chegar à lavra da avó, etc. Se a avó der uma caixa com vinte abacates e tiver de distribui-los pelas tuas três tias, o papá não precisa de máquina para achar quantos cada uma das titis receberá.
- Ai é papá? Então ensina-me matemática para ter também a quarta classe do tempo colonial!
E saíram abraçados para o pequeno-almoço que já estava morno.
 Já fim da tarde, ao sair do serviço, Nza Kutimbe comprou um quadro branco, canetas de feltro e um apagador. As manhãs de sábado passaram a ser “sagradas”. Tornaram-se dias de exercitação. Com a ajuda de alguns amigos mais velhos, Nza recuperou alguns livros já carcomidos pelo tempo. Manual de aritmética, da quarta classe do tempo colonial, e livros de leitura e exercícios gramaticais. Aos poucos, as novelas foram cedendo espaço à leitura e redacção e apenas as principais novelas eram visionadas quer pela mãe quer pelos filhos que preferiam as da disney. A má (temática) passou para “boa” temática de conversas diárias com os primos e os colegas de Arcádio e irmãos mais velhos. Até “noves fora” Arcádio já calcula de cor. Aconteceu mesmo.