Até ao registo destes acontecimentos o reino de Magestic desfrutava
de uma paz abundante e vida farta. Corria o ano de 3102 do tempo comum. Os limites
geográficos de Magestic, um reino secular, eram a Avenida da Lagoa Negra, a
leste; o Grande Rio Intermitente, a norte; e uns Estados autónomos em
constantes guerras, a oeste e sul. Era, sobretudo, a sul de Magestic que mais
se sentia a desestabilização que indirectamente acabavam por afectar o Magestic,
sua corte e seu povo.
Tata Ngana, Senhor das Terras, era a autoridade suprema de
Magestic, auxiliado por uma corte fiel e prestativa que administrava os Estados
vassalos e cobrava impostos.
Detentor de um poder hereditário, Tata Ngana, estava desposado
com Arra Gante, uma plebeia de origem citadina. O seu poder consistia num meio
termo entre o autocrático e o democrático, custando-lhe a alcunha de “O Senhor
do equilíbrio”. Ele , porém, preferia ser tratado pelo epíteto de “O inventor
da terceira via” que aos poucos levava o reino a transformar-se em império. Numerosos
eram os povos que o admiravam e tão notória era a áurea da sua corte e Estado.
- Se grandes males não houver, construirei um império que
sobreviva a todas intempéries durante mil anos. – Gabava-se aos embaixadores e
homólogos a quem oferecia banquetes.
Nu dia, daqueles em que o sol e nuvens negras se revezas no
alto dos céus, o reino de Magestic acordou alvoraçado. Num dos Estados litigantes
do sul, onde grassavam a fome e a miséria, a
rainha tinha feito comentários e comparações deselegantes em relação à
forma como o seu rei conduzia os destinos do Estado.
- Quero uma capital com torres iluminadas, universidades,
alamedas, sorrisos, transportes públicos e muito mais. É isso que quero que
faças em vez de te estares a afundar em guerras que só enfraquecem o nosso
Estado. – Disse Mbunda Inene, a rainha do Estado do Sul que ameaçou mesmo pedir
asilo ao rei de Magestic.
- Aié? Queres que te
dê o que o Norte tem? Como sabes que Magestic tem tudo isso? - Questionou o rei
Kasumuna furiosos.
- soube dos embaixadores e da media. - Respondeu Mbunda
Inene que nem imaginou o fel que bombeava o coração do seu marido.
- Pois é… se subestimas o meu governo e me colocas abaixo de
Magestic e Tata Ngana é porque há já muito tempo nos tens traído, a mim e ao
meu reino. Desmereces minha consideração e tens 24 horas para deixar o palácio,
se não queres ser decapitada em praça pública. – Sentenciou o rei possuído de
ira.
- Eu abandonar o palácio que ajudei a decorar? Por que não
abdicas antes e juntos nos exilamos para Magestic ou outro Estado que nos
queira acolher? – Refilou Mbunda Inene.
Não convencido mas também sem argumentos, numa atitude
cobarde, Kasumuna declarou guerra ao vizinho do norte, o Estado de Magestic.
O ataque relâmpago foi desferido às 5h de uma manhã. Mulhers
da vida retornavam às casas e donas de casa cuidavam do asseio para rumarem às
vidas diárias. Magestic estava em festa da coroação do rei. As suas tropas
desfrutavam do repasto e há muito não sentiam o troar dum canhão ou o tagarelar
duma kalashinikov. O belicoso Kasumuna aludiu um provável encontro secreto
entre sua dama e Tata Ngana como motivo da guerra.
O ataque injusto e sem fundamentos desferido pelo Estado
vizinho do Sul despoletou uma guerra civil em Magestic. Colocaram-se, lado a
lado, generais conselheiros favoráveis ao rearmamento do Estado para fazer
frente à guerra e outros que defendiam uma negociação incondicional com o belicoso
vizinho do sul para evitar a destruição do Estado. Neste segundo grupo
estava a rainha e parte da população impreparada
para a guerra que acusaram o soberano de relações promíscuas.
- Apelo à clemência e à calma. Vamos apelar as instancias
internacionais e regionais para se apurarem as reais motivações dos ataques contra
a nossa Pátria amada. – Pediu Tata Ngana à população reunida em frente ao
palácio real.
- Não, não, não. Negou o povo eufórico e embriagado, paradoxalmente
comandados pela rainha Arra Gante. – Queremos a paz urgente. Queremos a cabeça. – Exigiram.
- Eu, um homem livre,
filho de príncipes, neto de soberanos, com serventes na corte, bisneto de príncipes
com escravos, ser julgado em hasta publica por alegada traição ao meu próprio Estado?
Quem o fez crescer o tornar-se destaque na sub-região e continente? Nego. Nunca resignarei ainda que se quedem as
estrelas dos céus. – Afirmou veemente o rei, aplaudido pela corte.
Tata Ngana não abdicou mas a sua vida e imagem ficou seriamente
afectada. Deixou de ter vida pública como no passado. Tornou-se extrovertido e
seus sorrisos apenas eram vistos nas sonenidades com monarcas estrangeiros que
o visitavam ou quando retribuía visitas de cortesia. Até a água-ardente, sua
predilecta água deixou de marcar presença na sala de trabalho.
Os largos sorrisos em companhia da família tinham
desaparecido. A família e o reino estavam em retalhos. Faltavam as falas e Arra
Gante embora arrependida dos dislates não conseguia reanimá-lo. Era apenas mais
uma no palácio.
“Honra de rei lava-se com sangue”, comentava com os seus
colaboradores sem nunca esmiuçar como lavaria a honra perdida. Se investiria contra o Estado vizinho do Sul,
se contra a sua consorte que não a apoiou se contra a oposição palaciana. Durante
muitos meses e anos pensou calado em como resolveria a questão.
- Sacrificar a rainha Arra Gante? – Os seus botões
aconselhavam que não! Seria tomado como sanguinário.
- Mover guerra e aniquilar o Estado atacante do sul? – sacrificaria
o bem-estar da sua população e morreriam pessoas na guerra.
Diante do palácio real crescia uma figueira. Tinha sido
plantada no dia da sua entronização. Já tinha dezena e maia de anos, sendo
podada sempre com orientação vertical. Contava mais de dez metros. Tata Ngana
olhou para a árvore, os figos e a alegria dos pássaros que a habitavam. Contrastava
com a vida que levava nos últimos nãos.
- Vou entregar-me ao deleite e causar uma grande festa
jamais vista neste Estado. – anunciou ao secretário do palácio.
Como quem empurrado pelos ventos e puxado pelos ancestrais,
que o preferiram junto de si do que detestado por uma rainha e povo ingratos,
Tata Ngana lançou-se aos figos que espreitavam o terraço.
- Buuuummmmmmmmm!
O secretário do palácio nem tempo teve para pedir socorro. O
rei estava estatelado no pavimento térreo com as vísceras por fora.
Quando os bombeiros e o médico do Palácio chegaram Tata
Ngana estava já sem vida. Uma missiva, no bolso do casaco, descrevia a sua
ascensão e queda. Foi chorado durante meses e anos mas o reino de Magestic
jamais conheceu dias áureos como aqueles vividos durante o seu reinado.
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