No tempo ainda da trafulha, um jovem tecnocrata foi chamado ao governo (jovem naquela época em que a média etária era de sessenta e cinco. Ele tinha cinquenta e seis).
Constrangido por ter sido levado àquele grupo de má-fama, mas sem como dizer não, lá o jovem adulto decidiu entrar, para não ser expurgado ou mesmo expatriado e assumir o grande desafio de liderar o Organismo mais importante do seu governo. Era o coordenador das principais empresas de commodities e, por isso, responsável pela entrada de moeda externa e demais compromissos externos do Estado. Em linguagem terra-a-terra, diríamos que tudo passaria por ele, embora o chefe máximo não fosse ele. Longe desse poder, os seus dependentes reclamavam, dia sim, semanas também: - Chefe, os outros andam de Mercedes e nós sempre de kupapata. Pode fazer algo-algum junto daqueles exportadores sob dependência de Voss'Excelência?
- Cuidado. - Dizia ele, a olhar para o seu anelar que conservava uma modesta aliança de ouro monocromático com meros dois milímetros de largura e um de espessura.
- Há indivíduos ávidos de um pequeno pedido para descontarem um grande buraco.
Olhou para o anelar e mediu com palavras.
- Você pede a falangeta e eles cortam o dedo todo para justificar com o seu pedido. Cuidado!
Os dias foram passando. Ele na sua filosofia ética do exercício pleno da probidade. Os seus miúdos, sedentos de extravagâncias induzidas por vozes bairrentas, a reclamar a fome da barriga cheia, sempre ao ataque.
- Chefe, chefe! Olha a meta, chefe. Datamos quase a terminar o mandato. Os outros fizeram pé-de-meia. Pelo menos, faça-nos sentir o roncar de um motor com cilindrada. - Apelou, quase se ajoelhando, um neófito na equipa.
Era dia de feriado e o chefe decidira gastar o dia com os liderados, num exercício de coesão. Kambudi Neto era, na verdadeira acepção da palavra, um Líder que ensinava com exemplos de hombridade, firmeza, bom ser e bem fazer. Era acérrimo seguidor de Machel, para quem os governantes deviam "ser primeiros nos sacrifícios e últimos nos benefícios",
- Jovem, imagine que tem uma capoeira e um cozinheiro. Já viu galinha com duas moelas?
- Não chefe.
- Então, quando a ordem for para matar uma galinha e lhe aparecerem duas moelas no prato, desconfie. A capoeira pode fechar!
- Mas chefe, que tem a ver a capoeira e a empresa?
- Note bem. A capoeira é a empresa. Os activos são as galinhas. Se você manda o cozinheiro (gestor da empresa) matar uma galinha e te apresentar duas moelas no prato, é porque uma galinha levou para casa. Tenha cuidado em fazer pedidos de cabidela a um cozinheiro que gosta de galinha! - Rematou Kambudi.
O repasto prosseguiu, apimentado com isso e aquilo, lições de vida e frases para fazer o tempo voar. Os mais atentos retiveram a lição. Outros agiram como a flecha fleumática: entra de um lado e sai pelo outro.
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