quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

A DIFICULTADORA DO FÁCIL

Em 31º lugar, do Top 100 Grandes Sul-africanos, Oliver Reginald Tambo, nascido em 1917 e Falecido em 1993, foi um político anti-apartheid sul-africano e figura de destaque do Congresso Nacional Africano (ANC) que lidera o país do arco-íris desde a queda dos segregadores de Apartheid. Tambo e Nelson Mandela foram membros fundadores da Liga Juvenil do ANC que em 1943 decidiu passar das simples petições ao governo segregacionista aos boicotes, desobediência civil, greves e a não-cooperação, valendo-lhes várias reprimendas de um governo agressivo, sem compaixão e que pretendia ver o negro sul-africano sempre debaixo da bota da minoria branca.

Mal eu desconfiava que aquela cara tristonha tinha alguma surpresa desagradável e não tardou em mandar-me pôr a mochila na balança.

- Deve ter apenas entre oito a 10 quilos, procurei convencê-la ao que não foi na cantiga.

- Está bem, vamos pesá-la e depois saberás se é para despachar ou levar em mãos.

Dez quilos batidos. Sem mais nem menos gramas. Convencido de que levaria comigo a mochila, a moça corta o ticket de bagagem e manda a mala rolar para o despacho: O voo será pequeno e por isso são permitidos apenas oito quilos. Fiquei bwamado. - Oito quilos é para despachar? Nem já no avião da empresa em que trabalho, que é embraier 145, despacho essa mochila. Será que a SAA vai voar hoje com Kazabula? - Questionei sem que dela obtivesse resposta plausível.

- Moço já disse que é avião pequeno. Se tem computador tira já a mochila vai ser despachada.- disse possuída de poder e arrogância.

 Dei meia volta e comecei a marcar os passos em retirada, procurando sorver um ar fresco que me oxigenasse a alma maltratada. Dentro de mim, à medida que fui pensando na figura cujo aeroporto me receberia quatro horas depois, vieram-me também ideias sobre como seria aquela moça se fosse uma branquela, filha de boers, no país do sol nascente e no tempo em que Mandela, Walter Sisulu e Oliver Tambo desafiavam os cassetetes e as balas dos opressores. Teria sido, com certeza, mais uma que não se cansaria de lavar as mãos de sangue alheio. Preferi, por isso trata-la, nas minhas idas à memória, por “a dificultadora do facilitado”, nome que lhe pode cair a perfeição.

E os Joanesbrguenses, para não falar dos sul-africanos em geral, sabem que é no poupar que está o ganho. Basta ver as luzes, quase sempre de baixo consumo, as barreiras nos jactos das torneiras, o cuidado com os descartados e a proibição, pelo menos nos seus aeroportos, do uso do tabaco. Aqui são poucas as “salas Vip” para fumadores. E é no avião, ainda no ar, que se ouve esse anúncio para os que fazem gosto ao tabaco, não se importando, muitas vezes, com o desconforto dos outros, os fumadores passivos e sem sistema de defesa contra os malefícios do fumo.

Nas suas actividades, sejam bem ou não muito bem remuneradas, demonstram felicidade. Cantam, sem incomodar o utente e o colega, enquanto despacham, dançam enquanto caminham, esboçam sorrisos mesmo para homens e mulheres cujos idiomas não percebem e demonstram que na sua terra vive-se feliz com o que têm e o que ainda lhes falta. Quem me dera se pudesse trazer um pouco dessa felicidade dos que trabalham e disseminá-la pelas nossas empresas e instituições? Quem me dera, eu mesmo, ser um homem sempre sorridente, ante aos entraves da falta de meios de trabalho, mas sempre empenhado, entregando os produtos a tempo e realizando as tarefas nos prazos? Mas será mesmo que a infelicidade estampada nos rostos todos os dias, a lassidão na execução de tarefas que nos são acometidas, o espírito de deixa andar ou “empurra opara trás” levam-no a felicidade quando sabemos que devemos dar a nossa parte para construirmos o Edifício Angola? E vou aprendendo com os joaneburguenses que inspiram, com a sua felicidade qualquer homem trabalhador.

 Já a caminho de Cape Town, outra cidade sul-africana que põe muitas do norte da SADC em sentido, concentrei-me no comportamento e semblante das aeromoças e até “aeroidosas” que se fazem todas passar por moças de verdade, esbanjando sorrisos, boa disposição e contagiando os utentes de seus serviços. Tal sensação de estar bem, atender bem e transmitir confiança a quem se presta serviços levou-me a viajar no pensamento, ao encontro da manas (nem todas) do meus amado país que levam ao serviço e brindam os utentes internos e externos de seus serviços com a indisposição que lhes causou a água que não jorrou o suficiente na torneira, a energia que ameaça descongelar o frango, a carne e o peixe na arca ou mesmo o cantar madrugador dum galo com insónia, quando não é o ladrar intrépido do kambwá do vizinho possuído de medo dos “gatos” pretos que rondam os aposentos do seu amo, noite sim, noite também. E pensei no quanto essas lições de vida podiam ser-me úteis nas difíceis tarefas que me aguardam. Mas não é tudo. A mesma mala e os mesmos quilos despachados em Luanda enfeitou os meus ombros na ida e volta à Cape Town e com a mesma companhia que, para as rotas internas, até opera com aparelhos mais modestos em termos de envergadura. E me pergunto a cada momento. Mana é que então que se passa na tua vida, tão jovem ainda?
 Em Cape, subi a montanha eleita como uma das sete maravilhas do mundo e comparei-a com a beleza da nossa Fenda da Tundavala a reclamar por miradouros que atraiam turistas e lojas de “gifts” para que os turistas nunca se esqueçam da nossa Angola e contem estórias sem fim. Subi ao cume do monte mesa, viajando no cable e imaginei-me na Huila ou em Kabatukila, em Malanje. Por instantes, me distraí e veio-me ao ouvido um som, uma música já muito badalada, cujo refrão gritava alto para o mundo: Angola, tu (também) és capaz!

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